Fabiano Contarato*
Bandeira que ergui de forma quase solitária como delegado de delitos de trânsito por mais de dez anos no Espírito Santo e como diretor-geral do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-ES), a segurança no sistema viário avançou de forma consistente no Senado Federal a partir de propostas que apresentei e foram aprovadas na Casa. A começar por uma emenda minha que já virou lei: prisão sem direito a pena alternativa, após condenação definitiva, para motorista embriagado que matar ou lesionar alguém no trânsito enquanto dirige. Após tirar uma vida, o condutor infrator não pode ficar em liberdade – o que sempre acontecia porque a pena de prisão para esse crime podia ser trocada por prestação de serviços.
O Brasil ocupava na última década o 5º lugar em um ranking de mortes por acidentes de trânsitos no mundo. São mais de 40 mil vidas perdidas todos os anos e cerca de R$ 50 milhões em custos na Saúde pública anualmente. E, infelizmente, os únicos condenados nesta matéria sempre foram a própria vítima e sua família, que sofre pela dor da perda e pela certeza da impunidade. Vivenciei de perto o sofrimento de pessoas devastadas que iam à delegacia reconhecer o corpo de seus entes queridos. Por isso, nossas propostas têm abrangência nacional, mas sempre com o olhar atento às prioridades e à realidade da população capixaba.
Para mudar a realidade triste que nos rodeia, sigo a luta no Congresso Nacional. O Senado aprovou meu relatório favorável ao projeto de lei (PLS 32/2016) que obriga o motorista alcoolizado ou sob efeito de outra substância psicoativa envolvido em acidente de trânsito a ressarcir as despesas com assistência hospitalar das vítimas ao Sistema Único de Saúde (SUS). A iniciativa faz justiça, impondo ao motorista criminoso um ônus suportado hoje por toda a sociedade que financia o SUS. Reduzir acidentes alivia as contas públicas. No SUS, os setores de ortopedia e traumatologia, com mais de 60% dos leitos ocupados, teriam vagas para pessoas com doenças – e não acidentadas.
Tolerância zero para celular ao volante: passou em decisão final na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado nosso relatório ao projeto (PLS 435/2015) determinando que o uso de celular ou aparelho similar ao volante pode aumentar de um terço à metade a pena por homicídio culposo no trânsito. É preciso alertar que a violência, a imprudência e o consumo de álcool e outras drogas são responsáveis pela morte de milhares de pessoas nas estradas e rodovias do país. Sempre defendi a aprovação de uma legislação mais dura para punir crimes que ameaçam a vida no trânsito, medida aliada à implantação de políticas de educação, treinamento e reciclagem de motoristas.
O Brasil registrou mais de 40 mil mortos e 300 mil mutilados e com lesões graves em decorrência de desastres no trânsito nas estradas e rodovias brasileiras. Segundo o Ministério da Saúde, reflexo disso é que cerca de 70% a 80% das vítimas de acidentes de trânsito são atendidas pelo SUS e os acidentes de trânsito são o segundo maior tipo de ocorrência que gera atendimento nos serviços públicos de urgência e emergência em todo o Brasil. Nesse contexto, a CCJ aprovou meu parecer ao projeto de lei (PL 1.334/2019) que destina recursos das multas de trânsito para ações e serviços de saúde. O valor será transferido integralmente para o Fundo Nacional de Saúde (FNS).
Botão de pânico, transparência e acessibilidade
A mesma CCJ aprovou meu parecer substitutivo ao projeto (PLS 242/2018) que determina a instalação de botão de pânico em ônibus e micro-ônibus de transporte público de passageiros. A medida ajudará a inibir a ação de criminosos e, consequentemente, a reduzir o número de assaltos em transportes coletivos.
Também passou na CCJ meu relatório a favor de projeto de lei (PLS 356/2015) determinando que informações referentes a multas de trânsito e pontos na carteira de motorista devem estar disponíveis na internet. O objetivo é auxiliar os motoristas a tomarem consciência de seus atos.
O Senado aprovou projeto que permite a utilização dos recursos provenientes de multas de trânsito na adaptação das vias para a circulação das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. O PL 4.937/2020 incorporou emenda minha, inserindo no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) a tipificação da infração de parar veículo junto às rampas de acesso de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Quem incorrer nessa infração, de grau médio, terá de pagar multa e estará sujeito à remoção do veículo.
Também passou no Plenário do Senado nosso relatório a favor do projeto de resolução que cria a Frente Parlamentar pela Segurança de Crianças e Adolescentes no Trânsito (PRS 52/2021). Os acidentes trazem muitos prejuízos, mas nenhum dinheiro é capaz de pagar a perda das vidas humanas. Cerca de 30% das vítimas no país tinham entre 15 e 29 anos de idade. Não podemos nos acostumar com tais números. Reduzir acidentes no trânsito é uma preocupação mundial. A segurança do sistema viário é uma pauta que sempre vou defender.
Segurança no sistema viário
O Senado aprovou meu relatório a favor ao projeto de lei (PL 130/2020) que proíbe a divulgação e publicação, infelizmente cada vez mais comum, de vídeos e imagens de manobras perigosas e “rachas” que tenham objetivo de exaltar e promover práticas e indivíduos que estão colocando em risco as suas vidas e a vida de outras pessoas. Educação de trânsito e leis mais rigorosas são necessárias para inibir maus condutores e reduzir a impunidade. A proposta combate a apologia ao cometimento de crimes e infrações de trânsito.
Faremos, sempre, tudo que estiver ao nosso alcance para a construção de um sistema viário que preserva a vida, o nosso principal bem jurídico. Nesse aspecto, veículos de passeio terão de passar por testes de impacto (crash tests) antes de sua comercialização no país, segundo meu substitutivo aprovado na CCJ. Carros mais seguros protegeriam mais as pessoas, causariam menos gastos com acidentados no SUS e reduziriam custos com benefícios pagos pela Previdência Social (pensões por morte, invalidez e auxílios-doença). A vida humana tem valor incomensurável e precisamos garantir integridade física no trânsito.
Também relatei, e a CCJ aprovou, um cadastro nacional de radares eletrônicos de trânsito. Não se pode prejudicar a segurança de todos no trânsito suspendendo a operação de radares em função de procedimentos burocráticos. Já existem formas de responsabilizar os gestores públicos que não cumprem as determinações legais. Da mesma forma, o poder público não pode só fortalecer a indústria da multa no sentido arrecadatório ou com penas mais severas se sua principal função é prevenir e educar. Infelizmente, o poder público vem falhando na fiscalização, na educação e na hora de legislar.
Valorização de profissionais do trânsito
A Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado aprovou nosso favorável ao projeto de lei (PLC 180/2017) que rende adicional de 30% no salário dos fiscais de trânsito em razão da periculosidade da atividade que desempenham no Espírito Santo e no país. Agora, o texto segue para votação do Plenário.
O Senado ainda aprovou minha emenda que inclui agentes de trânsito ativos, inativos e aposentados entre os beneficiários do Programa Nacional de Apoio à Aquisição de Habitação para Profissionais da Segurança Pública. Essa importante categoria profissional do Espírito Santo e de todo o país poderá contar com condições especiais de crédito do programa para comprar a tão sonhada e merecida casa própria.
Batalha legislativa
Já apresentei quase 20 projetos de lei para diminuir a impunidade no trânsito e assumi aproximadamente 60 relatorias de matérias sobre o assunto. Uma das minhas propostas (PL 3.734/2019) em tramitação torna crime divulgar informação relativa a local, data ou horário de ação de fiscalização de trânsito, “blitz” ou similar, e estabelece aumento de pena se utilizado meio de comunicação em massa como a internet, aplicativo ou rede social.
Outra iniciativa (PL 5.189/2019) cria o Dia Nacional em Memória às Vítimas de Trânsito. Já o PL 6283/2019 proíbe a venda de bebidas alcoólicas em postos de combustíveis, razão de muitos acidentes que vi como delegado. Acolhendo sugestão do capixaba Iago Izoton, apresentei o PL 1211/2019, que tipifica como infração de trânsito gravíssima estacionar veículo em meio-fio rebaixado de acesso a pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida.
Com objetivo de reduzir a discriminação contra a mulher no trânsito e de combater a violência sexual dentro de veículos públicos ou de transporte privado, propus (PL 1467/2021) condicionar em lei a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação à realização de curso e de exame sobre a igualdade entre mulheres e homens no trânsito. A formação de condutores deverá incluir, obrigatoriamente, curso de direção defensiva, de conceitos básicos de proteção ao meio ambiente relacionados com o trânsito e de igualdade entre mulheres e homens no trânsito. A Argentina adotou medida semelhante.
Apresentei um projeto (PL 2.854/2019) obrigando a coleta e preservação de material biológico para a realização de exames toxicológico e etílico nas pessoas envolvidas em acidentes de trânsito onde resultem vítimas fatais ou mutiladas. Será possível identificar se a pessoa envolvida no acidente estava sob efeito de drogas ou álcool. Queremos tornar mais efetivo o esclarecimento de acidentes para determinar a eventual responsabilidade penal, civil e administrativa dos envolvidos.
Articulação política
Esse breve resumo de ações no Senado se soma a medidas judiciais e a trabalho intenso de articulação política para barrar propostas que pioram o CTB. Uma dessas frentes resultou na derrubada do veto do presidente da República que afrouxava os exames para obtenção de CNH. Com a vitória, esses exames permanecem de competência exclusiva de aos médicos e psicólogos peritos examinadores com titulação de especialista em medicina do tráfego e em psicologia do trânsito.
Estou em campo sensibilizando os parlamentares para a importância de um trânsito mais seguro e mais humano e trabalhando contra o enfraquecimento do CTB. A flexibilização da lei incentiva maus motoristas, reforça a impunidade e aumenta a insegurança. Cada apoio que recebemos fortalece essa vitória em nível nacional. É fundamental caminhar com a sociedade nessa causa de interesse público, coletivo e imediato: a defesa da vida humana. Passou da hora de aprovarmos e fazermos valer uma legislação mais rigorosa e transformadora a favor da vida e contra a impunidade. Tem que ser agora.
*Fabiano Contarato é senador pelo PT do Espírito Santo
Artigo publicado no Congresso em Foco em 18/03/2022.