Mais de 40 mil pessoas morrem todos os anos vítimas de acidente de trânsito no Brasil. Mais de 400 mil ficam mutiladas. E é para reduzir essa triste estatística que estamos mobilizados para barrar, no Senado Federal, um projeto de lei (PL 3.267/2019) do governo federal, já aprovado na Câmara dos Deputados, que está prestes a entrar em votação.
A proposta premia motoristas irresponsáveis com a vida do outro, reduz a punição por delitos cometidos pelos condutores de veículos e significa, na prática, uma ação política dedicada a impor graves retrocessos na legislação de trânsito brasileira.
Como delegado de delitos de trânsito por mais de dez anos e como ex-diretor-geral do Departamento Estadual de Trânsito do Espírito Santo (Detran-ES), vivenciei a dor de famílias que perderam entes queridos em acidentes. Quem recebe condenação é a família da vítima, que sofre a dor da perda e tem a certeza da impunidade dos culpados. Precisamos, sim, educar sobre o trânsito, mas não como forma de burlar as leis e cometer mais infrações. O motorista que desrespeita a lei não pode ter a certeza de que nada acontecerá.
Dentre alguns dos absurdos propostos no projeto que o Senado votará está o aumento do limite de pontuação para um motorista infrator ter uma carteira suspensa. O projeto também dobra o tempo de validade da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Outro erro com consequências graves: um motorista profissional que alcançar 39 pontos poderá fazer um curso de reciclagem e voltar sua contagem do início. Isso quer dizer que esse condutor terá o dobro de pontos até ter a sua CNH suspensa. A flexibilização de regras beneficiará a quem?
Para tentar reverter essas ameaças à segurança nas estradas e rodovias do país, apresentei 22 emendas com sugestões de mudanças no texto. Defendemos que seja garantida cadeia, de fato, para o motorista que matar ou lesionar no trânsito. Além disso, precisamos que a avaliação psicológica ocorra nas fases de obtenção e também de renovação da CNH. E sugerimos que a validade da carteira continue sendo de cinco anos, e com o máximo de 20 pontos para determinar a sua perda.
Sabemos que modificar o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é uma necessidade, mas desde que seja para priorizar a vida humana e combater a impunidade. Por entender que algumas alterações no CTB são necessárias, já apresentei 11 projetos de lei sobre trânsito e sou o relator de outros 63. No entanto, é preciso ter responsabilidade na reforma das leis, porque é necessário entender que dirigir é um privilégio.
Nosso trabalho é pela rejeição do PL 3.267/2019. Sua aprovação vai custar mais vidas. Estamos lutando pela preservação da segurança nas rodovias brasileiras, por um trânsito mais seguro e nenhum retrocesso na lei. E o apoio da sociedade é fundamental nessa causa de interesse público, coletivo e imediato.
Fabiano Contarato
Senador da República (Rede-ES), é presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado Federal
Artigo publicado pela Folha de São Paulo em 25/08/2020.