Entrevista ES Brasil

Por fevereiro 28, 2020Notas

Em 2018, as urnas refletiram o clamor do povo por mudanças e poucos Estados tiveram tanta alteração em seu quadro eletivo como o Espírito Santo. O servidor público Fabiano Contarato e o consultor na área de Segurança Marcos Do Val, atores conhecidos dos eleitores capixabas, porém sem qualquer experiência anterior na disputa de cargos políticos, garantiram suas vagas para Senado Federal deixando para traz personalidades fortes, entre eles os senadores à época Ricardo Ferraço e Magno Malta.

Completando o trio representativo, após ter sido derrotada nas urnas na eleição para o Governo do Estado, Rose de Freitas permaneceu no cargo para cumprir quatro anos de mandato restantes de sua nomeação. Diferente dos colegas, Rose começou sua carreira política em 1983 na Assembleia Legislativa por um mandato e na Câmara Federal foi uma das representantes do Estado em sete ‘períodos’ seguidos.

Passados oito meses de posse, como nossos representantes estão encarando o desafio confiado nas urnas? Quais foram as batalhas que tomaram para si? E as barreiras que estão enfrentando? Que perguntas o eleitor capixaba gostaria de fazer aos nossos senadores? Fizemos esse convite nos grupos de whatsapp da Next Editorial, organizamos os questionamentos que se repetiam, na entrevista identificados como PL (pergunta do leitor) e enviamos e deles para cada um dos eleitos. Confira nessa entrevista conjunta dada com exclusividade à ES Brasil.

 

Contarato 

  1. Nesses oito meses, quais conclusões chegou na vida político-partidária que eram “invisíveis” antes de assumir o cargo?

A sociedade capixaba valorizou o meu trabalho, como corregedor-geral do Estado do Espírito Santo; diretor-geral do Detran-ES; delegado de Delitos de Trânsito, identificando a ação humanizadora. Pessoas me paravam nas ruas, no supermercado, na faculdade e, muitas vezes, me abordando para pedir que ingressasse na política. E eu percebi que poderia fazer mais dentro dessa minha luta para aperfeiçoar o Código Brasileiro de Trânsito, ou seja, para combater a impunidade no trânsito, mas, também, em outros aspectos da nossa vida. Logo que cheguei ao Senado, senti vergonha de estar lá. Houve aquele vexame na eleição da Mesa Diretora. Falou-se muito em renovação, mas percebi que as velhas práticas continuam. Temos muitos privilégios e absurdos que precisam acabar, desde as pequenas coisas. Como o Senado é a casa do povo, se há elevadores privativos para senadores? Ou ainda, quando somente funcionários terceirizados passam por revista? São, constantemente, humilhados por serem pobres. Sinto as dificuldades de, ainda, persistirem os velhos modos de fazer política. Nesse aspecto, estou decepcionado. De outro lado, motivado a continuar lutando pela mudança real. Entrei na política com essa visão de que é preciso ter coragem para esse enfrentamento, mas sei que não é fácil e, muitas vezes, sinto vergonha porque é muito decepcionante o comportamento de uma boa parte dos nossos congressistas.

 

  1. Como tem sido equilibrar as questões da representatividade do Espírito Santo com a atuação legislativa em comissões e no pleno? O que fazer quando os interesses do país diferem dos interesses do Estado? 

Na atual conjuntura política brasileira, de polaridade extremada, cabe ao Senado Federal agir com moderação e cautela. Então, eu tenho buscado exercer meu mandato para atender a população capixaba e brasileira em temas abrangentes e de interesse nacional. O Brasil precisa investir muito em educação, em saúde, em segurança. Precisa garantir a efetivação dos direitos individuais e sociais já previstos na nossa Constituição Federal. Ela é a espinha dorsal do Estado Democrático de Direito. No entanto, o movimento inicial do governo federal não tem colaborado nem para cumprir a Constituição e nem para pacificar esse estado de ânimo no país, para reduzir a intolerância. São questões complexas. No Senado Federal, minha luta é pelo respeito aos Direitos Humanos, pelo cumprimento da Constituição Federal e dos Tratados e Acordos Internacionais que o Brasil é signatário.

  1. PL – As negociações em torno da reforma da Previdência mostraram que a “velha política” ainda tem muita força e os interesses pessoais dificilmente são deixados de lado em favor de um projeto de país. É utopia pensar em um Brasil com menos desigualdades e um cenário político mais decente?  

Estive com o relator da Reforma da Previdência no Senado Federal, o senador Tasso Jereissati e na oportunidade, pude sensibilizá-lo das emendas que estou apresentando, para poder frear os retrocessos que serão extremamente danosos para a camada mais pobre da população com a Reforma da Previdência. Nosso problema é que, hoje, há uma insensibilidade muito grande em relação às pessoas menos favorecidas, as mais pobres e contra as minorias. Quero atuar com mais efetividade em defesa das minorias: indígenas, negros, pobres, mulheres, LGBTs. Não fui eleito por um segmento, mas estou a favor da população mais pobre com o objetivo de reduzir a desigualdade social. É uma atuação ampla, que começou pelo trânsito, mas engloba educação pública de qualidade, saúde, geração de emprego e renda, mais participação efetiva de mulheres na política. É preciso reduzir esse abismo dos milhões que estão na pobreza ou recebem o ínfimo do salário mínimo e a concentração de riqueza na mão de tão poucos. Passou da hora desse Senado Federal fazer essa faxina moral e dar o exemplo para toda a população brasileira. Sonho com o dia em que não precisaremos mais de políticas afirmativas por já termos alcançado a plena igualdade, por já termos nos tornado uma nação efetivamente justa, fraterna, igualitária, em que nenhum segmento social se sobreponha a outro em direitos e oportunidades.

  1. PL – O seu embate com o ministro Moro e o voto contrário ao decreto das armas não foi uma traição com seus eleitores? O senhor chegou (absurdamente) a sofrer ameaça de morte por parte de uma pessoa, felizmente já identificada, e até surgiu um movimento nas redes sociais pedindo seu impeachment. Como avalia essa reação? 

É lamentável. Não mudei de posição. Fui eleito com um discurso de independência e mantenho as bandeiras da campanha: combate à impunidade, combate à corrupção e pela transparência e lutando para reduzir a desigualdade social. Eu acho, sinceramente, que a população está reverberando um comportamento oriundo do chefe do executivo. Infelizmente, o chefe do executivo tinha que ter um comportamento de propagar o amor, a pacificação social, uma articulação política no melhor sentido da palavra, mas ele dissemina o ódio. Então, as pessoas estão invertendo, elas acham que depois da fala que eu tive na audiência pública com o ministro da Justiça, eles se invertem. Uma coisa é eu me enaltecer, como eu valorizo e defendo a operação Lava Jato, porque ela é impessoal. Ela não pertence a uma pessoa, ela pertence a população brasileira, foi um divisor de águas. A outra coisa é a análise de um comportamento de um juiz, se ele feriu ou não um dos princípios do processo penal que é a imparcialidade. Ora, isso compete a entrar no mérito se houve ou não isso com o Supremo Tribunal Federal. Depois dessa minha fala, eu fui atacado moralmente e ainda continuo sendo atacado. Mas não vou recuar. Não me intimidam! Nós vivemos num estado democrático de direito, as pessoas podem não concordar com uma postura ou uma fala minha. Isso todo mundo tem o direito de não concordar. Mas isso não dá direito da pessoa ultrapassar esse limite e praticar crimes. Qualquer pessoa que me ofender, vai ser identificada e vai responder criminalmente e civilmente.

  1. PL – Somos todos os dias bombardeados por fake news tanto da extrema esquerda, quanto da extrema direita. Agora vemos o Meio Ambiente em meio a essa guerra e em tudo que se investiga tem podridão. O que fazer para garantirmos um mínimo de cuidado real com a Amazônia? 

Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é uma garantia constitucional, é um direito humano essencial, expresso no artigo 225. Enquanto o mundo luta em favor da preservação do meio ambiente, nós que temos a garantia constitucional (artigo 225), eu lamento em dizer, mas nós estamos retrocedendo. O Ministério do Meio Ambiente violou a Constituição Federal e deixou de cumprir seus deveres funcionais, perseguiu servidores, contribuiu para o aumento do desmatamento. O desmatamento acelerado é consequência da política de governo e acarretará em graves consequências hídricas para o país. Além disso, pode ter influência no mercado, uma vez que o mundo está voltado para a sustentabilidade. Eu, enquanto presidente da Comissão de Meio Ambiente no Senado Federal, não me furtarei de ajuizar ao promover projetos de lei no âmbito legislativo e no que não competir no processo legislativo, vou judicializar. É, portanto, imprescindível que a sociedade brasileira continue reagindo, coletivamente, contra essa agenda negativa do governo e que amplie as suas manifestações. Defender o meio ambiente é defender as vidas humanas que ainda estão por vir. O planeta está preocupado, o Brasil está preocupado, nós estamos preocupados com o desmonte que vem ocorrendo na área ambiental. 

 

  1. PL – Qual a avaliação do senhor para os projetos do Executivo de alteração nas leis de trânsito?

O governo tem agido, desde início do ano, como franco-atirador, desmontando estratégias, políticas e, agora, a legislação do Código de Trânsito Brasileiro. É mais um absurdo, uma sandice, esse projeto que elimina multa para motoristas que transportam crianças de forma irregular. Resolução do Contran prevê que é infração gravíssima, punida com multa e com retenção de veículo levar uma criança no carro sem observar regras de segurança. Ainda, a proposta do governo quer aumentar de 20 para 40 pontos o limite para motorista perder a carteira, ou seja, quer premiar e incentivar o mal comportamento no trânsito, passando a mão na cabeça dos infratores. Outras previsões do texto, que não concordo, são: por fim ao exame toxicológico para motoristas profissionais e reduzir a punição para motociclistas sem capacete. São medidas que não ajudam em nada as ações por mais segurança no trânsito. Não podemos concordar com esse projeto porque coloca a vida das pessoas, principalmente, das crianças em risco.