MPF dá parecer a favor de registro de dupla paternidade ou maternidade em ação judicial de Contarato

Por outubro 7, 2022Notícias

O Ministério Público Federal (MPF) deu manifestação favorável em ação popular movida pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES) na Justiça Federal para obrigar governo federal a permitir registro de dupla maternidade ou paternidade em documentos pessoais. Não há, nos sistemas da Receita Federal – para inscrição no Cadastro de Pessoa Física (CPF) – e do Tribunal Superior Eleitoral, formulários adequados para registro correto da filiação.

Conforme a Procuradoria da República, “deve a União adotar as providências necessárias no sentido de adequar os sistemas e cadastros da administração pública federal, notadamente quanto à inscrição do CPF e do Título Eleitor, para garantir direito ao registro da filiação sem discriminação por identidade de gênero ou orientação sexual”.

Contarato considera uma vitória de grande relevo a manifestação do MPF na ação, uma vez que representa aderência aos direitos das famílias homoafetivas já garantidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu há mais de dez anos, no julgamento da ADPF 132, a união homoafetiva como família, sujeita às mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva. O senador também é autor de projeto de lei (PL 2.356/2022) com o mesmo objetivo.

“É dever do Poder Público garantir o exercício de direitos individuais. Estamos sedimentando, com nossa ação popular e nosso projeto de lei, mais um passo vitorioso e histórico contra a discriminação em razão de gênero ou orientação sexual. Nossa Constituição determina ao Estado o dever de proteção da entidade familiar”, frisa o senador. O pleito decorre da atual impossibilidade de se incluir mais de um nome de pais ou mães quando do mesmo sexo no campo de preenchimento dos dados pessoais ao se realizar o Cadastro de Pessoa Física (CPF) no site da Receita Federal.

Conforme ressalta o MPF na ação, a União alegou apenas supostas dificuldades para implementar as medidas que decorreriam da procedência da ação popular; e que a matéria é objeto de projeto de lei (PL 2.356/2022) em trâmite no Congresso Nacional.

“Nenhum dos argumentos é capaz de afastar as alegações de direito invocadas na inicial. As questões de ordem prática, para implementação de alterações nos sistemas, podem ser melhor dirimidas na fase de cumprimento de sentença, não sendo óbice para a sentença de mérito. A eventual tramitação de projeto de lei também não constitui qualquer obstáculo ao enfrentamento da matéria pelo Poder Judiciário, sobretudo tendo em vista que
a violação aos direitos difusos, in casu, é atual e contínua”, reiterou o MPF.

Ainda segundo a manifestação do MPF, não se duvida que as alterações propostas no  PL 2.356/2022 seriam bem-vindas, já que um dos instrumentos de afirmação dos direitos humanos e das políticas antidiscriminatórias é a incorporação de garantias e direitos pela legislação e normas infralegais.

“Contudo, embora louvável o esforço na propositura desse projeto de lei, é certo que o registro de dupla maternidade ou paternidade é direito básico e incondicional de todo cidadão, sendo, portanto, obrigação inarredável que se impõe ao Estado independentemente de previsão em lei formal, conforme será demonstrado. É direito primário de toda pessoa a obtenção de certidão de nascimento e documentos pessoais que viabilizem o exercício da plena cidadania e o gozo dos direitos fundamentais. Esses documentos, por óbvio, precisam espelhar adequadamente os dados de identificação, dispondo de informações íntegras, corretas e, sobretudo, coincidentes com a realidade individual”, sustenta o MPF.

Assim, continua o MPF, nada mais evidente o dever de o Estado prestar a essas famílias a mesma proteção e os mesmos meios de garantia e de exercício dos direitos.

Segundo a ação, casos tornados públicos evidenciam dano causado aos usuários do serviço público, os quais, ao preencher os dados abertos no campo de informações do site da Receita Federal, constataram apenas o espaço para inclusão de um único nome materno da pessoa.

“Tais fatos violam direitos e garantias fundamentais, como a dignidade humana e a vedação à discriminação e hierarquização entre espécie de filiação, configurando danos extrapatrimoniais. Reitero que se tratar de demanda coletiva, e estou pedindo a anulação do ato administrativo da Receita e que o governo retifique o campo referente ao nome da mãe, disposto na inscrição do CPF e do Título de Eleitor, garantindo-se o direito ao registro da dupla maternidade, dupla paternidade ou família monoparental, em respeito aos direitos e garantias fundamentais”, frisa Contarato.